E se a última vez que vimos uma pessoa brilhasse como a noite de ano novo, o que faríamos de diferente?

Se o último abraço explodisse como fogos e o último beijo tivesse um gosto de algodão doce, saberíamos lidar com despedidas?

Porque a saudade a gente sabe que não vai passar, ela chega logo que a última vez acontece e carregamos ela conosco a partir de então. Ela formiga nosso coração toda vez e arde nossos olhos em pequenos detalhes.

Se aquele sábado à noite brilhasse como noite de ano novo e aquele último abraço explodisse como fogos de artifício, eu mergulharia nos teus olhos azuis e não voltaria, porque o mundo sem você é sem brilho, sem riso, sem abraço de domingo.

• Nossa, tava o maior trânsito! Parece que uma girafa atropelou um cara de bicicleta ou algo do tipo. - Brinco pra descontrair.
• Por isso sou a favor de cnh para os ciclistas… - Ele disse tentando não rir.
• Ei, respeite os ciclistas!

Ele é como a minha casa, tão familiar.

Nós marcamos um desencontro, uma espécie de despedida, algo para encerrarmos o ciclo, um ponto final para substituir essa reticência. 

Nunca mais senti por ninguém o que senti por ele durante tanto tempo, aquele amor que chega dói os ossos, aquela admiração. Sinto falta até mesmo dos sentimentos ruins.

• Café? - Ele olhava o cardápio embaixo dos óculos escuros.
• Hmmm… Capuccino? - Respondi enquanto tentava fechar as sandálias sem sucesso.
• Tá difícil aí? Por que não veio de tênis?
• Eu tenho 30, cabelos curtos e uso sandálias, prazer!
• Bons tempos os do jeans e all star…
• Depressão e catfish ainda estão na moda mas não fazem mais meu tipo.
• Aí… Essa doeu! - ele disse soltando o cardápio com um meio riso.

Se eu falar em voz alta e de forma clara que eu nunca conheci a única pessoa que já amei vou conseguir me desprender disso? Talvez se eu não guardar mais em sete chaves e perder essa vergonha eu consiga seguir a diante.

• Esses desencontros me lembram o Clube da Luta. 
• Você acha que eu só existo na sua cabeça? - ele parecia confuso, cruzando os braços.
• Eu tenho certeza. - A verdade mais dolorosa é aquela que a gente não queria nunca conhecer.
• Talvez eu seja, mas qual a importância? No final ninguém é de verdade mesmo.

Vez ou outra a gente marca esses desencontros na esperança de destruir o que não sabemos se um dia existiu, mas no final das contas não é o que queremos, nós só queremos reviver um tempo que não volta, um sentimento que não morre e alguém que tão perfeito que nunca existiu.

• Sem açúcar, por favor. - disse para o atendente com orgulho.
• Ah não, isso já é demais pra mim! - ele disse tirando os óculos escuros e ao ver seus olhos nossa conversa mudou de idioma, que saudade conversar com alguém que realmente entende o que você diz.

Eu escutei muito “você exige demais das pessoas” e tive muita dificuldade de entender esse peso, já que exijo das pessoas o mesmo que exijo de mim. 

Eu escutei muito “você não tem que esperar que façam o mesmo por você” e isso nunca fez sentido pra mim, qual o problema em ser grato?

Eu escutei demais “nem todo mundo é igual você” e eu nunca quis que fossem porque gostava menos de mim do que dos outros.

Então os anos foram passando e fui me moldando, me encaixando numa forma que é mais compreensiva, menos explosiva, espera a hora certa de falar, engole seco, se frusta e se culpa por exigir demais e fingir que não. 

Afinal, foi eu quem esperei muito de quem não tinha quase nada pra dar. A culpa foi minha porque não é obrigação dela ter gratidão. Se eu não sei lidar com a imaturidade dela é porque eu preciso ter mais paciência. Você não pode se chatear, eu não respondi porque sou muito mais ocupado que você.

E assim sinto que cada dia que passa sou menos eu, tão moldada no que devo ser. Engolindo cada “defeito” para não transparecer, bebendo as lágrimas que “não tenho o direito” de chorar.

Ontem tudo deu errado, ele seguiu a vida dele, nunca mais tomaremos sorvete juntos, ela contou minhas histórias, ele nunca mais vai desfilar por aqueles corredores com um lenço colorido... 

Não importa o que aconteça, para nós que ficamos, a vida continua. Acho que essa tem sido a lição mais difícil de aprender.

A maior tristeza, a menor decepção, a mais difícil perda, nada disso faz o tempo parar.

Até nos dias em que perco a fé, os minutos se arrastam. E quando me dou conta, fomos vivendo e revivendo e nos permitindo errar e acertar mais uma vez.

Viver requer coragem, e não estou falando daquela coragem para saltar de paraquedas, falo da coragem necessária para ser você mesmo, da forma mais sincera que se existe, mostrando seus defeitos e qualidades, dispondo do seu tempo, do seu colo e das suas fraquezas e ainda assim ser magoado.

Mas tudo bem, por que a vida continua! Continua para novas mágoas e novas decepções, mas também continua para novas descobertas e novas emoções. E se para cada coisa incrível que vir me acontecer eu precisar enfrentar um ou outro lobo em pele de cordeiro, eu estou preparada.

Esses dias li o trecho daquela oração que já virou música, tatuagem e até adesivo de carro. A oração que praticamente todos sabem, a oração de todas as religiões, aquela que dizem ser universal.

Mesmo diante disso, mesmo pedindo todas as noites, você ainda não entendeu. Toda vez que algo não dá certo, sempre que alguém se vai, todo atraso, cada momento sem explicação... Você pediu.

A gente acha que nessa altura do campeonato já estamos prontos para distinguir o bom, o mal, o ruim... mas esse é o real perigo, achar que se protegeu o suficiente e que ninguém mais irá te ferir.

Não estranhe se acordar numa manhã qualquer e por motivo nenhum alguém vir a ser um estranho, não ignore o seu coração quando ele disser que há algo errado. Hoje nada disso pode fazer sentido, mas antes de você se proteger, Ele te protegeu.

A gente engole o choro, levanta a cabeça e segue em frente. De novo e de novo, outra vez.

Fazemos isso porque escutamos desde cedo que chorar é fraquejar, desistir, vacilar. Então aprendemos a encher o nosso interior com todas essas lágrimas que não permitimos jorrar.

Mas foram nos dias de grande alegria que entendi: essas lágrimas são uma das poucas formas que temos de esvaziar. Toda aquela gratidão sufocando o meu peito me fez entender que às vezes chorar é a única opção, como fazemos com aqueles gritos que nos deixam roucos. 

O mesmo acontece nos dias ruins. Nós resistimos a tantas coisas, mas isso resulta num acumulo aqui dentro, num peso que às vezes se torna impossível de carregar. E muitas vezes são elas que nos ajudam a aliviar sensações. De dor, de medo e até de felicidade.

Esvaziar para liberar mais espaço. Espero que você esvazie para se encher de alegria, mas se caso não for assim, nunca é tarde para esvaziar de novo e novo, outra vez.